A proposta de mudança na taxação dos dividendos, atualmente em discussão pelo governo federal, está movimentando o mercado financeiro e levantando preocupações entre analistas, investidores e empresas. A medida, que visa acabar com a isenção sobre dividendos distribuídos, pode provocar uma mudança drástica na forma como as companhias buscam capital, desestimulando a emissão de ações e incentivando a preferência por instrumentos de dívida.
Essa tendência, que parece ser uma consequência direta do novo modelo tributário em estudo, foi destacada por especialistas durante entrevistas recentes, como a do canal do YouTube que abordou o tema com profundidade, com falas do economista Marcos Pinto e outros analistas do setor.
Tributação desigual entre ações e dívida corporativa
Hoje, as empresas têm duas formas principais de captar recursos: pela emissão de ações (equity) ou pela emissão de dívidas (debêntures, CRIs, CRAs, entre outros). Com a nova proposta, dividendos pagos a investidores passariam a ser tributados, enquanto os juros pagos sobre dívidas corporativas seguem dedutíveis do imposto de renda da empresa — o que, na prática, gera um benefício fiscal para esse modelo de financiamento.
Segundo o economista Marcos Pinto, esse desequilíbrio gera uma distorção no mercado: “A empresa vai achar cada vez mais vantajoso emitir dívida, porque consegue abater os juros pagos, enquanto a emissão de ações se torna menos atraente pela carga tributária sobre os dividendos”. O receio, portanto, é que essa mudança desincentive as companhias a abrir capital ou a realizar follow-ons, impactando diretamente a dinâmica do mercado de capitais.
Impacto para investidores e alocação de capital
A diferenciação entre dívida e ações atinge não só as empresas, mas também os investidores. Investimentos em títulos de dívida privados ou públicos, como CRIs, CRAs e debêntures incentivadas, continuam sendo isentos de imposto para pessoas físicas em muitos casos. Isso atrai capital para esses produtos, mesmo com riscos de crédito muitas vezes pouco transparentes.
“Eu mesmo já comprei CRIs sem conhecer o risco do emissor. Olhei o que pagava melhor e entrei”, comenta um dos entrevistados no vídeo. A fala retrata uma realidade comum entre investidores brasileiros que, diante de benefícios fiscais, acabam se guiando mais por rentabilidade aparente do que por fundamentos.
Além disso, a concentração de incentivos fiscais em setores específicos — como o imobiliário e o agronegócio — reforça o descompasso entre os instrumentos de captação, criando uma alocação ineficiente de capital na economia. “Por que setores como segurança pública e saúde não têm os mesmos incentivos que agro e imobiliário?”, questiona o analista, sugerindo que a política atual favorece alguns segmentos por questões políticas, e não econômicas.
Escassez de ações no mercado?
Uma das consequências práticas dessa mudança pode ser a redução da oferta de ações no mercado. Sem o mesmo incentivo para distribuir lucros via dividendos, e com os investidores buscando alternativas mais vantajosas do ponto de vista fiscal, pode haver uma escassez de papéis, o que impacta diretamente o funcionamento da bolsa.
“É cedo para dizer se os preços das ações vão subir com essa escassez, mas certamente a oferta tende a cair”, avaliam especialistas. Esse cenário pode prejudicar o pequeno investidor, que verá menos oportunidades para entrar em empresas com bom histórico de governança e geração de caixa.
Financiamento corporativo desequilibrado
A crítica central à proposta de tributação dos dividendos não está no princípio de tributar lucros, mas sim no fato de ela não ser acompanhada por uma revisão ampla do sistema de incentivos fiscais. Ao privilegiar instrumentos de dívida em detrimento do equity, a reforma pode comprometer o crescimento sustentável das empresas brasileiras.
“Se queremos um mercado de capitais forte, precisamos tratar com isonomia os diferentes instrumentos de financiamento”, defende Marcos Pinto. A proposta atual, segundo ele, foca apenas no dividendo, ignorando o ecossistema mais amplo do financiamento empresarial.
Reforma precisa de ajustes para evitar distorções
A taxação de dividendos, se implementada como está sendo proposta, pode gerar efeitos colaterais significativos para o mercado de capitais brasileiro. Ao favorecer a dívida em relação à emissão de ações, o país pode comprometer a diversificação e robustez do seu sistema financeiro.
Para investidores, empresas e reguladores, o desafio agora é equilibrar o sistema tributário de forma que ele não distorça as decisões de financiamento das companhias nem penalize o investidor que aposta no crescimento das empresas por meio do mercado acionário.
O post Governo propõe nova taxação de dividendos e desestimula emissão de ações no Brasil apareceu primeiro em O Petróleo.